domingo, março 10, 2013

"A VIDA QUOTIDIANA EM PORTUGAL AO TEMPO DO TERRAMOTO""




Primeiramente, quero agradecer a Carlos II , caro companheiro de aventuras bloguistas, a óptima sugestão de leitura .

Este livro, da francesa Suzanne Chantal, aborda  de maneira interessante e atenta o modo como se vivia no nosso país nos tempos de D. José I.

Fá-lo sem o costumado sentimento de superioridade com que os estrangeiros olham para nós. Que, em bastantes ocasiões,reconheçamos, não deixa de ter alguma razão.

Na época, no chamado "Século das Luzes", enquanto a Europa avançava em todos os campos do saber e do pensamento, Portugal estagnava sob a ignorância e a superstição. Aliás, éramos apodados d´"os cafres da Europa".

Sebastião José de Carvalho e Melo, uma das figuras bem analisadas pela autora, muito  tentou para modernizar o país e fazer com que saísse do conservador e reacionário orgulho da antiga nobreza ( altamente  exemplificada pelos Távora), que desprezou completamente a escolarização, pelo que o dito Colégio dos Nobres não teve sucesso.

Outra tentativa de tirar Portugal do obscurantismo , sem colocar em causa o catolicismo  nem a Inquisição (que utilizou até como arma política), foi a expulsão da Ordem de Jesus, que no Brasil chegou a empunhar armas contra determinações régias(sendo Governador da colónia um dos irmãos de Carvalho e Melo).

Esta desmesurada força da religião na sua forma mais cega   enraízava muito em D.João V ( para mim,de longe, o pior rei de toda a nossa História) , que esbanjou fortunas imensas em obras pias(capela de S. João Baptista na igreja de S. Roque, em Lisboa; convento de Mafra) e considerou que "Deus deu a umas nações os ofícios e a outras as riquezas" provocando a decadência e o descalabro do tecido produtivo do país.

A única obra pública que deixou, o Aqueduto das Águas Livres , foi construída com os impostos sobre a população enquanto oferecia a madre Paula uma banheira de prata maciça com muitas dezenas de kilos.Entre outros delírios do género e não só.

Os estrangeiros ficavam deslumbrados com a beleza de Lisboa e aterrados logo que punham o pé fora do barco que os transportara.

Após o terramoto que devastou por completo a cidade em 1 de Novembro de 1755, com muitas e mais graves consequências em todas as áreas do que as que nos ensinam nas escolas, D. José passou a viver na Real Barraca, na Ajuda, e ninguém mais o conseguiu convencer a viver num edíficio de alvenaria.Por ironia, a construção desapareceu por causa dum incêndio.

O Carvalhão, mais tarde Marquês de Pombal, tomou a reconstrução em mãos e criou a base da Lisboa que todos conhecemos .

O livro aborda os costumes e o modo de viver da população assim como a extrema dependência de Portugal face à Inglaterra, coisa que Sebastião José também cerceou na medida do possível obrigando os ingleses, por exemplo,  a contribuir para a reconstrução da capital e criando a região demarcada do vinho do Douro, primeira a nível mundial.

Temos que reconhecer a extrema visão de Pombal, embora  a sua gestão fosse eivada de elevado autoritarismo , esmagando sem hesitações quem se lhe opunha.

Com a chegada ao Poder de D.ª Maria I,foi afastado sem nenhum tipo de consideração e , mesquinhamente, todos os rancores e também ingratidões vieram ao de cima: " Quando D.José I soltou o último suspiro em 24 de Fevereiro de 1777, João Cosme da Cunha, que devia tudo a Pombal e que o serviu com tão complacente ignomínia, deu-se ao luxo de lhe proibir o acesso à alcova real, dizendo-lhe :«Vós nada mais tendes que fazer aqui»".

Suzanne Chantal foca também as péssimas ligações terrestres e a enorme centralidade de Lisboa e Porto assim como a morosidade da Justiça e a incompreensão e resistência ás mudanças.

Presta homenagem à reconhecida hospitalidade das pessoas( referindo especialmente o Alentejo) e ao bom clima.

A conclusão que me fica da leitura do livro reforça a minha convicção de que Portugal se perdeu numa qualquer curva de um tempo labiríntico continuando perdido até hoje e cada vez mais.

Recomendo a leitura, já que a escrita é agradável , o passado tem muita importância para percebermos o presente e porque é sempre pedagógico saber como nos apercebem pessoas de outras nacionalidades e , consequentemente, com o necessário e indispensável distanciamento que, por maior lucidez que tenhamos, nunca nos é possível conseguir.

28 comentários:

  1. Não tem que agradecer ao Carlos II (Carlos II, não que tenha sangue azul, embora confesse ser um admirador e defensor de uma monarquia constitucional para o nosso país, mas sim porque é o meu segundo blogue) mas adiante: É de facto um boa leitura e a São faz uma descrição correcta do livro.
    Boa semana.

    ResponderEliminar
  2. Um povo ignorante da sua (verdadeira) história é um povo capaz de repetir erros horrendos...

    Faz bem em recomendar boas leituras...

    ResponderEliminar
  3. Gosto muito de História, fiz mesmo duas cadeiras de História de Portugal!
    Custa-me sempre a visão negativa que têm de nós...
    Pelo Saramago escreveu um livro fabuloso a propósito da construção do Convento de Mafra! :-))

    Abraço

    ResponderEliminar
  4. Ainda hoje não nos deixamos civilizar! Temos espírito de coitadinhos, pobrezinhos, ranhosinhos... Por isso "gostamos" dos Cavacos e dos Coelhos!

    Que gente!

    ResponderEliminar
  5. Na nossa simplicidade fomos explorados e escravizados por muitos que ocuparam o poder e em nome de Deus exploraram os mais pobres e sempre os desrespeitaram.
    Um obra que vale a pena ler e comparar com a exploração actual. Relvas/ Coelho/ Cavaco ou Portas...

    ResponderEliminar
  6. Hoje em dia não leio muitos livros históricos ( apesar de algumas biografias, à sua maneira, também o serem) mas parece-me bem curioso este que aqui nos traz, amiga.
    Amanhã é a segunda segunda-feira da Bertrand e quem sabe se não caberá na minha lista de compras?
    Uma boa semana amiga

    ResponderEliminar
  7. Agradeço a recomendação, não sendo o género de livro que mais gosto de ler, tenho a certeza que da sua leitura se tirará mais conclusões que de um simples romance. :)

    Bons sonhos, São! :)

    ResponderEliminar
  8. Tomei nota. Talvez o posso encontrar na biblioteca.
    Boa noite. : )

    ResponderEliminar
  9. Se gostas de História, te agradará.

    Bons sonhos.

    ResponderEliminar
  10. Não sei se poderei lê-lo muito embora me agradem os livros de história. Estou a ler um neste momento "De Igaedo à Senhora do Almotão" um livro que narra as origens daquela zona do País desde muito antes do nascimento do mesmo.
    Quanto ao facto de o País se ter perdido em alguma curva da história, sou da mesma opinião. Meu pai costumava dizer que não se devia esperar grande coisa de um País que nasceu com um filho a bater na mãe.
    Um abraço e uma boa semana

    ResponderEliminar
  11. Nós temos um encontro previsto, não é? Nesse dia levo-lhe este livto.

    neste fim de semana que vem não estarei cá, mas podemos pensar num dos próximos, sim?

    Tem graça, pois é mesmo para esses lados que vou(embora quase só de passagem), rrss

    Portugal é um caso de estudo, realmente!!

    Boa semana, amiga

    ResponderEliminar
  12. Claro que tenho que agradecer, CARLOS!

    O meu segundo blogue tem também o meu nome, mas em maiúsculas, rrss

    Estava já desconfiada dessa sua opção por uma organização tipo Inglaterra, sabe?

    Tudo de bom

    ResponderEliminar
  13. A História oficial , quer da Humanidade quer de cada país, tem imensas lacunas e enfeites.

    O Cristianismo, ele próprio, foi re-inventado pelo Vaticano e encontra-se à beira do colapso na versão católica.

    Quanto mais soubermos sobre a maneira com as coisas se passar(a)m mais hipóteses temos de não repetir esses erros horrendos, ROGÉRIO

    Tudo de bom

    ResponderEliminar
  14. Depois me dirá a sua opinião, sim?

    Um abraço, LINO.

    ResponderEliminar
  15. ROSINHA, que tenhas passado um felzi dia de aniversário e essa felicidade se derrame para o futuro!

    Também me dói a visão negativa, mas temos que a aceitar dado ser verdadeira.

    É um pouco como quando estive no Egipto: é um mundo absolutamente diferente do nosso e que nos espanta.

    "Memorial do Convento" foi o primeiro livro que li de Saramago, rrs...mas não o meu preferido.

    Boa semana

    ResponderEliminar
  16. Não era D. Carlos que dizia . "Lá tenho que regressar àquela chlodra"?

    O romano tinha razão: somos um povo que nem se governa nem se deixa governar: incrível!!

    Enfim...ou é sina ou maldição nascer aqui, ainda por cima quando se é organizado e pouco comformista como eu1

    Beijinhos, GRACINHA

    ResponderEliminar
  17. Penso , LUÍS, que esta nossa mania de nos entregarmos ao primeiro peralvilho que fala bem(ou nem isso) é pior que ingenuidade: é burrice e , nalguns casos, não querer nem pensar nem saber as coisas.

    Como é possível votar Cavaco para tudo e mais alguma coisa repetidamente?!

    Como é possível votar Portas, depois dos submarinos?!

    Como é possível votar sempre PSD /PSD?!

    Um abraço

    ResponderEliminar
  18. Fico à espera do resultado, rrss

    Prefiro este género a biografias.

    E aprecio muitissimo romances históricos.

    Boa semana, amigo CARLOS.

    ResponderEliminar
  19. TETÉ, gostos são gostos, obviamente, mas este tem uma leitura fácil.

    Claro que os romances são mais agradáveis, embora eu seja suspeita, porque aprecio desde sempre romances históricos, rrss

    Boa semana.

    ResponderEliminar
  20. Olá, São!

    Já li a história da vida do Marquês de Pombal, há uns bons anos, mas não recordo o autor...mas recordo que lhe era favorável na forma como analisava o trabalho por ele feito, valorizando mais o aspecto de estadista do que o de homem.Outros autores escolherem exactamente o ângulo oposto, concentrando-se no lado "negativo" do seu carácter: Há uma boa parte da obra dele que não é certamente consensual, não pelo que fez, mas antes pela forma que utilizou para lá chegar.Não há ninguém perfeito, apetece dizer,e se ele o fosse o mais certo seria que pouco nada teria conseguido fazer...Pessoalmente, acho que foi um dos estadista com mais visão que já viveram e fizeram obra neste país - e que muito jeito nos daria ter agora à mão...desde há já um bom par de anos a este parte...

    Quanto à sugestão, pode ser que um dia destes calhe...

    Boa semana,com um abraço.
    Vitor

    ResponderEliminar
  21. A Vêm dizer aprendemos pouco a história e continuamos com despesismo de alguns, agora não é monumentos nem obras, mas ricas tachadas :(
    Beijinhos

    ResponderEliminar
  22. Infelizmente, assim é, amiga.

    Infelizmente também , pode ter a certeza de que continua a haver selecção no ensino privado ao contrário do que acontece no público.

    Bom serão para vós

    ResponderEliminar
  23. Pombal , D. João II e D. Pedro V foram das pessoas que mais tentaram fazer algo pelo país...só que foram assassinados(D. João II), morreram novos(D. Pedro V) ou foram afastados brutalmente(Carvalhão).

    Enfim...lamentavelmente as coisas são como são e Portugal não me parece ter emenda!

    Concordo contigo: necessitamos urgentemente de alguém com visão e força de carácter!

    Bom serão, amigo VÍTOR.

    ResponderEliminar
  24. Tenho dificuldade em encontrar o pior rei, foram todos maus, daí a refundação que a história impõe hoje, para que outra dinastia de bons comece, o marquês, nunca percebi aquela devoção pelo Zézinho I, devoção de homens por homens parece-me sempre estranho, mas a história é omissa, ou mente, nas coisas de boudoir. O FMI foi genial em ter escolhido um etiópe para gerir os cafres da Europa.

    ResponderEliminar
  25. D, João II não foi, não. Por isso o mandaram para os Algarves a morrer, já envenenado.

    Não sei se essas devoção não era ao contrário...o Zézinho, ficou tão aterrorizado e perdido com o terramoto que quando Carvalho e Melo tomou sobre si todas as responsabilidades o alívio foi tremendo e a gratidão também.

    Tenho um pavor pãnico de missionários e refundadores: o coelho manso acumula, para ,al dos nossos pecados!

    Boa semana

    ResponderEliminar
  26. "é sempre pedagógico saber como nos apercebem pessoas de outras nacionalidades"

    Vivo essa experiência constantemente no quotidiano e sem fuga possível. E de forma tão mais agravada ainda porque carregada com todo o rancor dirigido contra o dito ex-opressor-saqueador-colonizador. Só que ao invés de Chantal, que estudou e entendeu, este rancor é baseado na mais pura ignorância e dogmatização.

    Sempre admirei o génio de Pombal. Entendo até alguma da sua rigidez (para não ser muito mais contundente) pois não vejo que de outro modo ele conseguisse confrontar a feroz e reaccionária dormência da fidalguia portuguesa, que dum modo geral sempre se preocupou mais com lambança pessoal que serviço à nação. E não só a fidalguia lusa, teve Pombal que enfrentar, mas também essa organização criminosa que era a Companhia de Jesus (jesuítas), cujo único propósito era a escravização ideológica de todo o mundo.

    E sabes o que mais me incomoda ainda? É que deste lado do Atlântico vim encontrar uma nação que sofre dos mesmos males. Pois fundada pelos mesmos biltres que vinham com o único fito de enriquecer fácil e a qualquer custo, longe que estavam do poder da corte, inculcaram no povo o vício, não do pão e circo, mas da cachaça e circo. O povo aqui diz: "O brasileiro tem mesmo que rir e fazer festa, para levar de boa as amarguras da vida."

    Um grande abraço de infinita saudade

    PS: desculpa a desorganização do meu texto, mas creio ter passado a ideia. ;)

    ResponderEliminar
  27. nada desorganizado e bastante claro, além de também pedagógico.

    O Brasil já teve tempo para se libertar de muita coisa má que Portugal aí deixou e obteve a liberdade sem , felizmente, escorrer um gota de sabgue , pois a casa real portuguesa teve a iniciativa de separar os dois países.

    Pombal foi duro em demasia, mas fez avançar o país e só não conseguiu mais porque , como bem afirmas, a nobreza retrógrada e a facinorosa Companhia de Jesus - mas também a própria população - não permitiram!

    Um abraço apertado, de matar saudades.

    ResponderEliminar

"BENVEGUT AQUÈL QUE NOS VEN MANS DEBÈRTAS"
(Saudação Cátara)