sexta-feira, julho 24, 2009

UM (IN)VULGAR EXÍLIO

24 de Julho de 1959.

António Ferreira Gomes sai de Portugal, deixa para trás tudo quanto construiu ao longo de anos, vai por tempo indeterminado para o estrangeiro e, no coração, leva a amargura que sempre acompanha a partida.

A trágica tristeza da ida para outro país pelos mais diversos motivos não era invulgar nesse infausto período designado por Estado Novo, em que a pata de António Oliveira Salazar e sequazes esmagava com crueldade brutal qualquer veleidade de se sonhar com a liberdade , fosse ela qual fosse.

A única razão de estranheza neste forçado exílio, surge do facto de o proscrito ser alguém com altas responsabilidades no interior da fechada hierarquia da Igreja Católica portuguesa, completamente submetida ao ditador.

Alguém que um ano antes ( mais precisamente, em 13 de Julho de 1958) tivera a coragem de romper a vergonhosa conivência da sua instituição com o regime ditatorial em vigor, através de uma Carta Aberta dirigida a Salazar.

Neste documento , o seu autor põe a nu as chagas do país e as atrocidades cometidas sobre a população, denunciando os seus responsáveis e dizendo directamente ao Presidente do Conselho aquilo que considerava da sua actuação.

Como se imagina , um acto tão destemido não poderia deixar de ter um elevado preço para quem o assumiu com toda a frontalidade. Aliás, até quem consigo colaborava teve dissabores graves - como, por exemplo, o padre Manuel Martins ( o futuro "Bispo Vermelho" de Setúbal).

Assim , Salazar e o cardeal Manuel Gonçalves Cerejeira, seu amigo de longa data e responsável máximo da Igreja, moveram todas as suas influências e utilizaram todo o seu poder junto do Vaticano para que fosse afastado das suas funções e , de preferência , do país.

Ora de um Papa com o detestável perfil de Pio XII - germanófilo, protector dos criminosos de guerra do regime fascista católico do croata Ante Pavelic, aliado político de neofascistas - António Ferreira Gomes, bispo do Porto, não poderia, evidentemente, esperar qualquer tipo de apoio. Como, aliás, não o teve também da esmagadora maioria dos padres e religiosos portugueses, cúmplices cobardes de toda esta vergonhosa manobra.

Deve-se dizer que o facto de a igreja portuguesa se ter calado e se ter prestado a todos os jogos sujos durante este negro e duro tempo histórico , é perfeitamente coerente com o desempenho do Vaticano ao longo de toda a sua presença na Terra até aos dias de hoje.

Consequentemente, um ano após a vinda a público desta denúncia clara da difícil situação suportada pelas pessoas em Portugal, o bispo foi obrigado a ir viver para Roma e impedido de regressar à pátria.

Só dez anos depois, em 1969, regressaria a Portugal , mas já sob o aval de Marcelo Caetano.

Porque muita gente parece andar esquecida da dureza do infame Estado Novo e muito mais gente parece nem estar sequer informada das suas crueldades e atropelos, não quis deixar de aqui assinalar uma data tão importante.

VIVA A LIBERDADE!!

HONRA A QUEM LUTA POR CAUSAS JUSTAS E NOBRES!!

36 comentários:

  1. É, a injustiça nunca falta onde o autoritarismo se impõe. Bj, amiga querida e um bom fom de semana.

    ResponderEliminar
  2. Pois é como dizes, linda.

    A injustiça é fruto sazonado da ilegalidade.

    Bem hajas!

    ResponderEliminar
  3. Grito contigo por la libertad, querida amiga.

    ResponderEliminar
  4. Que marvilhos é gritarmos juntos, meu estimado companheiro.

    ResponderEliminar
  5. Sim, importante abrir os olhos, os ouvidos e o coração a quem anda cego e desinformado!

    LUIZ

    ResponderEliminar
  6. Lá está, aqui lei-o frontalidade.
    Continua assim...forte!!!

    ResponderEliminar
  7. E a quem interessa tanto tanta desinformação, senão aos mesmos de sempre, LUIZ?...

    Saudações.

    ResponderEliminar
  8. Com a tua ajuda, continuarei...

    Fica bem, MAGYMAY

    ResponderEliminar
  9. Cegueira e desinformação...o prato do dia!Medo da verdade...e apologia do medo...sufoco e "castração"...

    Beijinho doce e obrigada pela visita.

    ResponderEliminar
  10. Amiguinha:
    Num texto poderoso remetido ao tempo opressivo de antes da Revolução dos Cravos.
    António Ferreira Gomes, um nome a reter e ca registar. Pelo brio. Pela luta pela liberdade. pelo amor e entrega aos outros.
    Já sumariei.
    Como consegue expressar dar viva voz a personagens e acontecimentos marcantes com tanta doçura e encanto visíveis e manifestos...?
    É uma amiguinha de sonho.
    Linda. Admirável e sensacional. De fascínio.
    Bem-Haja, amiga.
    Beijinhos de gratidão pela sua linda amizade...Muitos!

    pena

    MUITO OBRIGADO por ser justa e íntegra no que faz com pureza de sentimentos e pela amizade que muito prezo para comigo.
    Muito linda...sabia?
    Sempre a lê-la com cuidado pela forma mágica como o que faz.
    Bem-Haja, amiguinha.

    ResponderEliminar
  11. O que é esse elo que nos faz perder o rumo quando deixamos nosso lugar de aromas e imagens?
    Deixar o que nos construiu sempre dói. Que tenha sido para o melhor, dentro de mais esse que deixou seu berço.
    Abraço e bom final de semana.

    ResponderEliminar
  12. Hoje, vivemos exilados na nossa própria pátria. É diferente a ditadura, mas não deixa de ser ditadura. Não tem a forma da outra, mas tem o seu conteúdo.

    Comemos os restos, como então.

    O país é um enorme campo de concentração.

    A tragédia, é que nos permitem eleger os guardas e o director do campo.

    Eles sabem fazê-la.

    Um grande beijo.

    ResponderEliminar
  13. Uma mão cheia de canalhas que, infelizmente, nunca receberam a punição merecida.

    Uma ideia; Se o Estado devolve terras (abandonadas)nacionalizadas após o 25 de Abril aos anteriores proprietários, por que não pode exigir por justiça aos descendentes dos canalhas?

    Kiss, Kiss!
    Bom fim-de-semana!

    ResponderEliminar
  14. Que bom tê-la aqui, MEU DOCE AMOR!

    Castração da verdade e impunidade dos criminosos é infelizmente vísivel também na nossa vida de hoje, efectivamente.

    Por isso é indispensável a memória da tragédia que foi para Portugal , a infânia da ditadura.

    Um bom fim de seamana com os seus.

    ResponderEliminar
  15. Estimadisssimo PENA, se há quem tenha de ficar em dívida de gratidão, sou eu. Pela sua amabilidade , pelo seu modo de expressar o que sente, pela pesssoa que demonstra ser.

    A memória de todas as pessoas que tiveram a coragem e dignidade de se levantar contra Salazar e Caetano, merecem a nossa palavra e a nossa presença.

    Um óptimo fim de semana, en companhia dos seus.

    ResponderEliminar
  16. Minha querida CLARICE, o bispo do Porto foi remetido para um forçado exílio dourado na Cúria Romana: Salazar - com a conivência do cardeal-patriarca de Lisboa, Cerejeira - jamais lhe perdoou a ousadia da publicação daquela Carta e assim impediu sempre o seu regresso ao país.

    Houve casos ainda muito piores , pois bastantes acabaram em assassinato puro e simples de quem se opunha ao regime.

    Um bom fim de semana, linda.

    ResponderEliminar
  17. Meu querido amigo MONTECRISTO, é uma alegria imensa esta tua inesperada aparição aqui.

    Sim, tens razão: vivemos numa pseudo democracia...em certo sentido pior do que a ditadura pura e dura, pois se tem a ilusão de estarmos livres.

    Um abraço com muitas saudades e amizade.

    ResponderEliminar
  18. Meu caro FRANCIS, no estado de sítio a que chegámos parece-me que restam muito poucas pessoas decentes para que seja possível castigar os canalhas e sua descendência: mais de metade da população portuguesa iria para a prisão!

    Um excelente fim de semana.

    ResponderEliminar
  19. E a liberdade tem de ser sublinhada dia-a-dia, em todos os detalhes da nossa vida. Quer no plano político, profissional ou mesmo na esfera pessoal, há sempre limites a defender.
    Beijos.

    ResponderEliminar
  20. São

    Nunca é de mais lembrar até porque quem não viveu durante esses tempos cruéis de ditadura subestima muitas vezes a dureza e crueldade do regime.
    O exemplo que tão bem retratas é um entre muitos que poderiamos citar.
    Porém aqui temos a conivência da igreja católica para crueldades sem nome a fim de que certos poderes mativessem intactos os seus privilégios.
    António Ferreira Gomes, um nome que não deverá ser esquecido e que tu recordaste e mostraste com determinação.

    Um abraço minha querida

    ResponderEliminar
  21. Na minha história do Manel no Sexta tenho deixado bem explícito o que foram esses anos.
    Um abraço e uma boa semana

    ResponderEliminar
  22. Para quem preza a liberdade tanto a nível colectivo como pessoal - como é o meu caso - a sua ausência quase asfixia.

    Por isso tenho como um dos meus mais amados poemas aquele em que o grande Miguel Torga clama por ar livre!


    Uma feliz semana, estimada FILOXERA!

    ResponderEliminar
  23. LIDINHA. minha querida, a Igreja católica é desde a Idade Média uma história de poder e infâmia.

    E esta verdade deve ser dita por muito que se respeite quem verdadeiramente considera o catolicismo o seu caminho para Deus.

    A denúncia da falsidade e da corrupção do Vaticano é também uma homenagem feita a quem tem lutado para reformar tanto o Papado quanto a Cúria, a quem criou a esmagada Teologia da Libertação, a quem aderiu ao Movimento dos Padres Operários, a quem defende o fim do celibato obrigatório.

    Que a tua semana seja excelente.

    ResponderEliminar
  24. Sim, eu sei: tenho acompanhado...embora por vezes em silêncio.

    Uma feliz semana, amiga ELVIRA!

    ResponderEliminar
  25. Desconhecia esta história, mas não me surpreende face aos métodos autoritários de Salazar, quanto à Igreja Católica, enquanto foi dirigida pel Cardeal Cerejeira estava instrumentalizada, e vários clérigos tiveram problemas...

    ResponderEliminar
  26. Agora é que é o fim: se uma pessoa tenta e informada como o António desconhecia o drama do Bispo do Porto como está o conhecimento acerca da História nestas gerações mais recentes?

    É por isto que cada vez mais a vida cívica se resume ao Cristiano-o-grande e afins!!

    Viva a televisão portuguesa , as telenovelas brasileiras e outras, as largas análises futebolísicas!!

    Fique bem.

    ResponderEliminar
  27. legal teres lembado da história...como será o futuro se a história não é dita?

    ResponderEliminar
  28. pela liberdade, sempre! mas há tanta confusão na cabeça de tantos que a gritam...
    querem metger-nos os dedos pelos olhos adentro, xará, tantossssssssss, mas não podemos deixar!
    beijinhos

    ResponderEliminar
  29. e assim se reavivam os dias...

    no breve traço apenas.

    l.i.b.e.r.d.a.d.e. sempre.

    . um beijo São .
    . uma boa semana .

    ResponderEliminar
  30. O ditador não perdoava a ninguém que lhe fizesse frente. Todos os ditadores são assim...
    Viva a LIBERDADE.
    Um beijo São

    ResponderEliminar
  31. Quem se se esquece do passado, perde o presente e arrisca-se a cometer os mesmos erros no futuro, não é?

    Um abraço, ADRIANA.

    ResponderEliminar
  32. Concordo de todo contigo, querida xará.

    Há quem confunda liberdade com libertinagem e que só implica direitos, esquecendo os deveres.

    Beijinhos, GAIVOTA.

    ResponderEliminar
  33. Que bom ter-te como companheiro nestas lutas, meu caro!

    Umm grande abraço, PAULO.

    ResponderEliminar
  34. ...e não há como exterminá-los, GRAÇA?!

    E aos que retorcem os factos históricos que podemos fazer?

    Tudo de bom, companheira.

    ResponderEliminar
  35. Depois de tanto sofrimento, tanta desilusão, vivemos actualmente num desespero de não vermos ninguém a emergir com possibilidades de poder oferecer-nos algo de bom.
    Nasci, no tempo da grande noite e tantos anos depois, morro no escuro

    Bj. (q. amiga)

    ResponderEliminar
  36. Meu caríssimo amigo, o drama - porque é um drama!- é(-nos) comum.

    Bem hajas.

    ResponderEliminar

"BENVEGUT AQUÈL QUE NOS VEN MANS DEBÈRTAS"
(Saudação Cátara)